terça-feira, 17 de novembro de 2009

Mãe





O mundo não é maternal
Martha Medeiros

É bom ter mãe quando se é criança, e também é bom quando se é
adulto. Quando se é adolescente a gente pensa que viveria melhor sem ela, mas é um erro de cálculo.
Mãe é bom em qualquer idade. Sem ela, ficamos órfãos de tudo,
já que o mundo lá fora não é nem um pouco maternal conosco.
O mundo não se importa se estamos desagasalhados e passando fome. Não liga se virarmos a noite na rua, não dá a mínima se estamos acompanhados por maus elementos.
O mundo quer defender o seu, não o nosso. O mundo quer que a gente fique horas no telefone,
torrando dinheiro. Quer que a gente case logo e compre um apartamento que vai nos
deixar endividados por vinte anos.
O mundo quer que a gente ande na moda, que a gente troque de carro, que a gente tenha boa aparência e estoure o cartão de crédito.
Mãe também quer que a gente tenha boa aparência, mas está mais preocupada com o nosso banho, com os nossos dentes e nossos ouvidos, com a nossa limpeza interna: não quer que a gente se drogue, que a gente fume, que a gente beba.
O mundo nos olha superficialmente. Não consegue enxergar através. Não detecta nossa tristeza, nosso queixo que treme, nosso abatimento.
O mundo quer que sejamos lindos, sarados e vitoriosos para enfeitar ele próprio, como se fôssemos objetos de decoração do planeta. O mundo não tira nossa febre, não penteia nosso cabelo, não oferece um pedaço de bolo feito em casa.
O mundo quer nosso voto, mas não quer atender nossas necessidades. O mundo, quando não concorda com a gente, nos pune, nos rotula, nos exclui.
O mundo não tem doçura, não tem paciência, não pára para nos ouvir.
O mundo pergunta quantos eletrodomésticos temos em casa e qual é o nosso grau de instrução,
mas não sabe nada dos nossos medos de infância, das nossas notas no colégio, de como foi duro arranjar o primeiro emprego.
Para o mundo, quem menos corre, voa. Quem não se comunica se estrumbica. Quem com ferro fere, com ferro será ferido. O mundo não quer saber de indivíduos, e sim de slogans e estatísticas.
Mãe é de outro mundo.
É emocionalmente incorreta: exclusivista, parcial, metida, brigona, insistente,
dramática, chega a ser até corruptível se oferecermos em troca alguma atenção.
Sofre no lugar da gente, se preocupa com detalhes e tenta adivinhar todas as
nossas vontades, enquanto que o mundo propriamente dito exige eficiência máxima,
seleciona os mais bem-dotados e cobra caro pelo seu tempo.
Mãe é de graça.



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